_BOLETIM TEKOÁ KUERY

O PREÇO JUSTO E O VALOR IMATERIAL DA PRODUÇÃO ARTESANAL DA CULTURA GUARANI
O PREÇO JUSTO E O VALOR IMATERIAL DA PRODUÇÃO ARTESANAL DA CULTURA GUARANI

A produção artesanal é elemento constitutivo da cultura e da cosmologia indígena Guarani; Esse conhecimento é transmitido de forma geracional – dos mais velhos para os mais jovens da comunidade. Para Poty Eliana, liderança indígena da Tekoa (aldeia) Paranapuã, localizada no litoral sul de São Paulo, no município de São Vicente, relata as diferenças geracionais na produção dos artesanatos, antes mesmo da comercialização: “a minha mãe fala que o cesto hoje em dia já é mais variado, né? Que eles fazem os pequenos e médios, mas que antigamente elas só faziam os grandes mesmo pra carregar lenha e pra carregar milho, pra carregar os bebês também era usado.”

No processo de produção é valorizada a tradição ancestral e o reconhecimento da terra “mãe” como fonte de toda vida. Assim, há o alinhamento da produção aos movimentos da natureza: – considera-se, por exemplo, os ciclos da lua para a colheita dos materiais que servem de matéria prima. Para Poty Eliana cita que sua avó se inspira nos elementos da natureza para produzir os desenhos das cestarias: “o desenho é só das cobras, mas as cores já vem dos pássaros, né? Dos pássaros vermelhos são mais bonitos […]”. Por isso, a produção dos artesanatos é uma das formas de fortalecimento e de resgate da cultura indígena Guarani, por trazer a conexão ancestral e  manter viva a tradição. 

Entretanto, diante da desigualdade social, atrelada ao modo de produção capitalista, os artesanatos passam não somente a ter um valor cultural-ancestral, como significam também um meio de subsistência, devido principalmente ao processo de não demarcação das terras e da não garantia dos direitos indígenas, as comunidades estão submetidas às restrições do Estado, como o acesso à mata para plantio e colheita, bem como outras atividades tradicionais. Com isso, a produção e comercialização dos artesanatos tornam-se uma das principais fontes de geração de renda e economia local para as comunidades indígenas.

Mas, diante da tradição indígena Guarani, como pensar em um comércio mais justo, em que valorize o Nhandereko – o modo de ser e viver Guarani?

Da necessidade de comercialização dos artesanatos, surge a demanda de organizar outras formas de economia, em que priorize a cosmologia Guarani, o conhecimento popular e ancestral, reconhecendo, desse modo, o valor imaterial que também faz parte da produção dos artesanatos. 

Para isso, nos debruçamos na perspectiva do preço justo, a qual considera o valor material, mas também o valor cultural dos processos produtivos, em que os sujeitos também são protagonistas, visto que são os idealizadores dos desenhos e das formas dos artesanatos, são os que executam a busca e manuseio das matérias-primas e são os que realizam o trabalho manual de confecção dos materiais, ou seja, participam de todas as etapas dessa cadeia produtiva.  

Aliado a isso, nosso objetivo é fomentar e contribuir com a autonomia dos povos indígenas, o que compreende a valorização e o fortalecimento dos saberes tradicionais e originários, de modo que priorize o modo de ser e viver Guarani, no sentido de construir uma economia mais justa para a comercialização dos artesanatos e, consequentemente, a geração de renda das comunidades indígenas, a qual torna possível a preservação da cultura e garantia do futuro dos descendentes Guarani.

Para isso, foram realizados encontros por meio virtual e presencial, entre as lideranças das Tekoas Mirim e Paranapuã e o grupo de apoiadores que constroem essa rede, em que teve como tema de discussão o processo de comercialização dos artesanatos, ao qual buscou-se elencar os elementos que constituem a sua produção, para que assim seja possível chegar a um preço que permita um retorno econômico mais justo às comunidades indígenas.

Por meio dos relatos das lideranças indígenas sobre a produção dos artesanatos foi possível definirmos a perspectiva do preço justo como direcionamento para atuação, uma vez que não somente considera o custo dos materiais, mas também a quantidade de horas trabalhadas e, essencialmente, o conhecimento do artesão, que está atrelado a sua ancestralidade e modo de viver, ou seja, ao valor imaterial do artesanato. A perspectiva do preço justo, desse modo, apresenta-se como farol para a construção de uma alternativa de comercialização da produção artesanal Guarani, uma vez que se fundamenta não só em uma economia justa, mas em um sistema justo, o qual os costumes e valores culturais são pilares para se pensar a comercialização. 

#preço-justo#artesanatoindígena#culturaGuarani#valor imaterial

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